Não há certeza, não há previsibilidade. Assim é a vida, assim são as relações. Por isso ele estremeceu ao vê-la depois de um mês. Ela também estremeceu.
Se encontraram repentinamente na curva de uma esquina, na escuridão de uma noite fria. Ruas de paralelepípedos sujos. Neblina que aos poucos deixou aquela ingênua beleza feminina aparecer. Nevoeiro que logo o mostrou. Desarmado. Desamparado. Ainda apaixonado.
Ela tentou fingir por um momento que ali já não havia nada. Nem uma emoção, nem um sentimento, nem um afeto. Mas o afago não deixou. O olhar firme logo se desmanchou. Apareceu o susto e o espanto de tal encontro tão inimaginável acontecer justo na noite mais fria. A expressão de dúvida e confusão sumiram por detrás da boca que levantou no lado esquerdo e do sorriso que apareceu nos olhos dela. O afago. Seus dedos finos e suas unhas vermelhas tocaram-lhe o rosto. Um leve carinho que se iniciou perto dos olhos dele, morreu no queixo com vontade de nascer na boca. Vergonha. Timidez. Tímida diante da pessoa com quem mais teve intimidade. Tímida perante a intimidade que já existiu.
Fins de relacionamentos são injustos com os sentimentos. E com as vontades. Também com o costume. Sempre há um pouco de comodidade nessa paixão toda. Mas o estranho é o estranho mesmo. Ora compartilhar imensa intimidade e cumplicidade. De repente completos estranhos. Não ser mais com o outro. Ser sem ele. Sem ela.
Ele gostou daquele carinho. Percebeu a mão delicada e gelada de inverno morrer no seu queixo. Queria que ela tivesse morrido na sua boca. Queria morrer na boca dela. Queria, como nunca deixou de querer, o gosto da saliva dela. Gosto de puro beijo. Sorriu sinceramente. Chegou mais perto. Ele não sabia se as bochechas dela estavam rosada por causa do vento invasivo ou do reencontro.
Eles tentaram se manter neutros, mesmo depois da visível felicidade, da imensa vontade, da clareza no olhar.
Se abraçaram. A rua estaria em silêncio não fosse pelo rápido gemido de conforto que ela mostrou por estar com ele. A rua estaria em silêncio não fosse pela respiração emocionada que ele não conseguiu disfarçar. A luz amarelada do poste fazia uma única sombra na parede. Agora que ela não via o rosto dele e ele não via o rosto dela as expressões se sentiram livres para dizer o que eles preferiram esconder.
A sombra não era mais uma só. Dois corpos que se amaram inúmeras vezes. Duas pessoas que ainda se querem. Um último olhar. Um adeus. A certeza de que não é o último olhar, o adeus. Ela seguiu reto e ele também. Vontade de outro reencontro inesperado. Vontade do beijo que não aconteceu. Mas eles não olharam pra trás.
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